segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Algumas Considerações sobre Atos de Cobrança, Bancos e Cadastros de Dados

Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não poderá ser exposto a ridículo nem mesmo submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. O credor possui o direito de cobrar as dívidas existentes e vencidas, nos limites do exercício regular do direito e não de forma abusiva. Portanto, o que é vedado por lei não é a cobrança de dívida, mas a forma inadequada como que esta pode ser feita.
É certo que o ato de cobrança, por si só, importa um mínimo de constrangimento até mesmo pelo estado de sujeição que se encontra aquele que deve, no entanto apenas os atos desproporcionais serão ilegítimos. Poucas ligações para a residência ou trabalho do devedor sem identificação do conteúdo do que se quer tratar, envio de correspondência sem sinais indicativos da cobrança, cobrança via judicial não caracterizarão uma cobrança abusiva.
Bancos e cadastros de dados, pela troca de informações coletadas passaram a traçar o perfil dos consumidores, pessoas físicas ou jurídicas, quando na concessão do crédito,tornando-se uma medida preventiva de realização de maus negócios. Os bancos de dados são os denominados serviços de proteção ao crédito, cujo destinatário é o fornecedor. A entidade realiza o cadastro, mas não o faz em interesse próprio. Já nos cadastros os próprios consumidores fornecem os dados, geralmente no momento da aquisição do produto ou serviço, ambos espécies do gênero arquivos de consumo. O Código de Defesa do Consumidor dedica alguns dispositivos sobre a matéria, notadamente na Seção VI do Capítulo V, intitulada "Dos bancos de dados e cadastros de consumidores" (arts. 43 e 44), complementada por normas que embora direcionadas aos fornecedores de produtos e serviços, se correlacionam com os cadastros, caso do art. 39, VII, que veda o repasse de informações depreciativas a respeito do consumidor quando este age no exercício dos seus direitos, bem como das sanções de caráter administrativo (art. 56) e penal, estas sobre coagir ou constranger por afirmações falsas, incorretas ou enganosas na cobrança de dívidas (art. 71), impedir ou dificultar o acesso do consumidor a dados cadastrais, em suas diversas modalidades de arquivo (art. 72) e, ainda, omitir ou agir com desídia na atualização das informações, em detrimento daquele (art. 73). Duas, portanto, são as modalidades de conduta vedadas: impedir e dificultar o acesso a tais informações. Quanto a primeira, entende-se por impossibilitar, proibir e a segunda em criar empecilhos através de exigências ilegais ou desproporcionais. Só o fato de tentar impedir já a consuma, uma vez que tentar impedir já significa dificultar. Ressalte-se que o fornecimento de informações insuficientes ou incompletas é o mesmo que o seu não fornecimento. Não apenas os bancos de dados que prestam serviços a terceiros como por exemplo SPC e SERASA têm caráter público, como os próprios cadastros internos das empresas, mesmo que passíveis somente de uso pelo próprio detentor. Neste passo, garante-se o direito de defesa para serem questionados seus conteúdos através da garantia constitucional habeas data. A comunicação da inscrição do devedor em cadastro de inadimplentes deve ser imediata, seja positiva ou negativa, sendo obrigação exclusiva da entidade responsável pela manutenção do cadastro, cuja falta poderá acarretar compensação por danos morais (verbete n° 359 da Súmula do STJ). Cabe às entidades credoras que fazem uso dos serviços de cadastro de proteção ao crédito mantê-los atualizados, de sorte que uma vez recebido o pagamento da dívida, devem providenciar, em breve espaço de tempo, o cancelamento do registro negativo do devedor, sob pena de gerarem, por omissão, lesão moral passível de compensação. Daí que, sendo a iniciativa do credor a abertura dos dados, faz todo sentido em que seja dele o ônus de providenciar o cancelamento respectivo junto à entidade cadastral, após cessada a sua razão de ser. Assim dispõe o art. 8º do Regulamento Nacional dos Serviços de Proteção ao Crédito, in litteris: "Art. 8º. As associadas-usuárias assumem, perante a mantenedora do SPC e terceiros, a responsabilidade total pelos registros dos débitos em atraso, demais ocorrências e seus imediatos cancelamentos". Nos casos em que a dívida estiver sub judice, tem-se entendido que para permitir o cancelamento ou a abstenção da inscrição do nome do devedor em cadastro de proteção ao crédito, o juiz deverá cautelosamente analisar o caso concreto, sendo indispensável a existência de prova inequívoca ou da verossimilhança do direito alegado. Ressalte-se que a informação negativa não poderá ser mantida por prazo superior a 5 anos, contados da data do vencimento da dívida inadimplida ou após consumada a prescrição da pretensão da ação de cobrança. Em recente jurisprudência do STJ afirmou-se que a reiteração da conduta do consumidor em inadimplir, seguida da existência de diversas anotações afasta o cabimento de reparação. Não é possível presumir que o consumidor experimente com mais uma inscrição qualquer sentimento vexatório ou humilhante anormal, porque a situação não lhe seria incomum. Portanto, se a inscrição se der sem a respectiva notificação, ou seja, irregularmente, terá o consumidor apenas o direito de vê-la cancelada. (verbete n° 385 da Súmula do STJ). Atualmente já se fala em cadastro positivo (PL nº 836/2003), segundo o qual analisa-se, individualmente, o comportamento financeiro do consumidor, considerando os pagamentos efetuados dentro do prazo estabelecido. Dessa análise, extrai-se uma classificação ou pontuação que viabilizará o acesso, por exemplo daquele consumidor a taxas de crédito diferenciadas. A crítica já iniciada por alguns é no sentido da possibilidade de risco de vazamento das informações pessoais contidas no banco de dados, o chamado roubo de identidade” ou “identity theft”, além da colisão entre os direitos fundamentais à intimidade, à vida privada e à informação, à livre iniciativa. Em suma, embora a matéria em tela seja polêmica, espera-se que estas breves considerações conduzam os leitores à reflexão.

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